Retaliação comercial pode afetar remessa de royalties em software

16/03/2010

Foi aberta nesta segunda-feira, 15/3, a consulta pública que vai colher contribuições sobre as retaliações que serão aplicadas contra os Estados Unidos relacionadas a direitos de propriedade intelectual. A consulta ficará aberta por 20 dias, quando então as sugestões serão avaliadas pelo governo e submetidas à Câmara de Comércio Exterior (Camex).

Na consulta, a Camex listou 21 medidas que poderão ser aplicadas. O governo chegou a cogitar a retaliação em serviços, mas optou por se concentrar nos direitos de propriedade intelectual. As medidas listadas dizem respeito ao audivisual, programas de computador, medicamentos, inclusive veterinários, produtos químicos e biotecnológicos agrícolas, cultivares, músicas e obras literárias.

Há possibilidade, ainda, de adoção de medidas abrangentes, como o aumento dos valores cobrados pelo registro de patentes no país. Também podem ser adotadas a retirada ou suspensão de prazos de proteção de direitos ou, ainda, a possibilidade do Brasil importar artigos de terceiros países onde, por exemplo, um determinado medicamento não tenha direito à patente.

O diretor do Departamento de Economia do Ministério das Relações Exteriores, Carlos Márcio Cozendey, evitou afirmar se um ou outro item estará necessariamente na retaliação. Ele reconheceu, porém, que deve ser mantida a lógica adotada na primeira lista divulgada, de 102 itens que terão a alíquota de imposto de importação ampliada.

Naquele caso, o governo optou por uma lista abrangente, que atingiu diversos setores, embora com efeito limitado. Caso, como indicou Cozendey, o governo adote o mesmo critério, é de se esperar que todos os itens citados na consulta pública sejam, de alguma forma, efetivados.
No caso dos softwares, por exemplo, a retaliação, caso venha a ser aplicada, deve afetar a remessa de royalties para as matrizes nos Estados Unidos – na verdade, o efeito é sobre patentes americanas, ainda que se tratem de empresas de outros países. “Teríamos que criar um direito comercial sobre essa remuneração”, disse Cozendey.

Ou seja, trata-se de um mecanismo que ainda não existe - a cobrança sobre parte do direito de remuneração do detentor da propriedade intelectual do software. Nesse caso, não haveria efeito para os consumidores brasileiros, apenas na redução da remuneração a esse detentor do direito de propriedade.

A retaliação, no entanto, não é indiscriminada. Há um limite determinado pela Organização Mundial do Comércio (OMC). No total, o Brasil pode retaliar em até US$ 829 milhões, mas US$ 591 milhões já dizem respeito à lista de 102 bens divulgada na semana passada. Assim, sobram US$ 238 milhões para os direitos de propriedade intelectual.

O Brasil foi vencedor na disputa com os Estados Unidos relacionada a subsídios pagos pelo governo americano – ou seja, os subsídios foram considerados ilegais pela OMC. Com isso, o órgão mundial de comércio autorizou o Brasil a retaliar os EUA, inclusive de forma cruzada, como é o caso das medidas de propriedade intelectual.

O principal objetivo disso é ganhar aliados nos próprios EUA. “Esperamos que esses setores pressionem seus congressistas para a eliminação dos subsídios ilegais”, admite o diretor do Departamento de Economia do Itamaraty. Na semana passada, o secretário de Comércio dos EUA esteve no Brasil e reiterou a vontade de negociar, mas até agora não surgiram propostas concretas. Se forem efetivamente adotadas, será o primeiro caso em todo o mundo de retaliação cruzada.

Site: Convergência Digital
Data: 15/03/2010
Hora: 13h25
Seção: governo
Autor: Luís Osvaldo Grossmann
Link: http://www.convergenciadigital.com.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=21985&sid=11