Fornecedores locais enfrentam barreiras à exportação

08/06/2010

Empresas brasileiras têm dificuldade para atuar no exterior com venda de serviços, mas o cenário começa a mudar graças a estratégias agressivas dos fornecedores.

O mercado de tecnologia da informação pode ser considerado um dos mais importantes para a economia brasileira, com participação de cerca de 7% do Produto Interno Bruto (PIB). A maior parte do faturamento do setor vem de serviços prestados internamente. E, apesar de todas as iniciativas realizadas ao longo dos últimos anos, a presença dos fornecedores locais no mercado internacional continua tímida.

De acordo com números da Associação Brasileira de Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom), o Brasil exportou 2,2 bilhões de dólares em 2008 e fechou o último ano com aproximadamente 3 bilhões de dólares em exportações. A expectativa é de que esse número suba para 3,5 bilhões em 2010. Um volume bem abaixo da Índia, por exemplo, que fechou 2009 com 55 bilhões de dólares com offshore na área de TI.

Aumentar essa participação é um dos desafios do setor. Mas o aquecimento do mercado interno e a oportunidade de crescimento no Brasil jogam a favor e contra a internacionalização. O cenário econômico favorável fortalece as companhias locais e aumenta o potencial de investimento em pesquisa e desenvolvimento, com foco no mercado externo. “Ao mesmo tempo, as empresas deixam de investir em estruturas lá fora com o medo de perder competitividade no País”, diz o presidente da consultoria IDC Brasil, Mauro Peres.

A escolha natural das companhias tem sido focar no mercado interno, já que o País ainda tem muito a evoluir no grau de informatização de suas empresas, principalmente entre as pequenas e médias. A aposta é que essa atuação possa alavancar, em um segundo momento, os avanços das empresas brasileiras de TI no cenário internacional.

O mercado brasileiro só tende a crescer, principalmente com a perspectiva de organização de dois eventos de porte: a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos. “Várias empresas nacionais vão cuidar de serviços repassados pelas grandes multinacionais que concentram contratos nesses eventos", considera Peres. Ele afirma ainda que, no médio prazo, essa pode ser uma oportunidade para impulsionar a atuação fora do País.

As empresas de pequeno porte também têm sua oportunidade, principalmente as que buscam o fortalecimento em consórcios que reúnem diversas organizações. “A associação com outras companhias, no entanto, deve ser acompanhada de um planejamento paralelo de fusões e aquisições”, avalia o especialista da IDC. Para Peres, a escala é necessária para que os fornecedores invistam na personalização de ofertas para diferentes mercados e idiomas.

Enquanto os eventos não chegam, as companhias buscam no mercado referências para ganhar poder de fogo no mercado internacional. A aceitação de uma empresa brasileira, de acordo com o sócio da Módulo, Álvaro Lima, não é fácil inicialmente. “Temos de começar pelas companhias que possuem filiais no Brasil e para as quais já prestamos serviço”, analisa.
Laércio Cosentino, presidente da Totvs, concorda com a visão da Módulo. Ele acredita que o esforço de crescer internamente pode ser visto como uma maneira de trabalhar pela internacionalização. “Aproveitar o forte mercado nacional para se fortalecer é fundamental. Foi o Brasil que permitiu o nosso crescimento a taxas elevadas ao longo dos últimos anos e essa força vai se refletir nas operações internacionais”, relata Cosentino, que é contundente ao afirmar que não vai deixar de crescer no País para priorizar a atuação no exterior.

O diretor de relações internacionais da Tivit, Edson Matsubayashi, também aponta que a presença no mercado nacional ajuda a abrir portas fora do País. “Quando a subsidiária de multinacional contrata nossos serviços, fica mais fácil mostrar o que é a companhia”, diz. Como exemplo ele cita que o trabalho no banco HSBC no Brasil serve como uma referência em qualquer lugar do mundo.

Outra aposta da Tivit para mostrar seu trabalho ao mundo é a participação no projeto do Débito Direto Autorizado (DDA), da Câmara Interbancária de Pagamentos (CIP) em parceria com a Federação Brasileira de Bancos (Febraban). “A própria Câmara fez um road show em 14 países apresentando a solução. Sentimos o interesse dos outros países de entender esse modelo e replicar as vantagens”, detalha o diretor.

Essa visibilidade, segundo Matsubayashi, propiciou a captação de acionistas internacionais na ocasião em que a Tivit realizou sua oferta pública inicial de ações (IPO, do inglês Initial Public Offering). Hoje, mais de 90% dos detentores de papéis da companhia são investidores estrangeiros.

Principais barreiras
O histórico de alguns países na área de tecnologia da informação, como Índia e Coréia do Sul, se destaca pela forma meteórica de ascensão no setor. Mas o que aconteceu nessas nações não foi por acaso: os governos encararam a TI como um mercado estratégico e tomaram medidas compatíveis com esse enfoque.

A realidade ainda não é essa no Brasil. Entre os desafios a serem vencidos está a própria percepção do setor dentro da sociedade. Para quem está envolvido em tecnologia, é difícil enxergar o problema, mas a TI tem pouca visibilidade para o governo e para a sociedade em geral. “Estamos em uma área pouco divulgada. Os jovens do interior, por exemplo, mal sabem da oportunidade que há em atuar num setor que tem uma oportunidade gigantesca de carreira”, diz o presidente da BRQ, Benjamin Quadros.

Com a falta de reconhecimento que o setor enfrenta, a capacidade de gerar mão de obra e de atrair investimentos fica reduzida. “Embora existam medidas bem-sucedidas de algumas organizações, o setor ainda carece de leis de incentivo e programas de capacitação. Isso sim possibilitará o aumento do offshore", destaca Quadros, que acrescenta: "Se medidas não forem tomadas, corre-se o risco de perder o setor cada vez mais para Índia e China."

O déficit no idioma inglês também é apontado como um dos grandes obstáculos. O Brasil tem a reputação de formar profissionais excelentes, mas sem a proficiência na língua inglesa necessária para prestar serviços lá fora. “O Brasil, ao contrário de outros exportadores de serviços tradicionais, é um ambiente hostil para quem não fala português”, afirma o presidente da CPM Braxis, José Luis Rossi.

O executivo afirma que elabora sistemas de recrutamento pensando em atacar essa questão, mas admite as dificuldades. “É muito mais fácil treinar um profissional em tecnologia do que em inglês”, diz Rossi.

Site: Computerworld
Data: 04/06/2010
Hora: 8h24
Seção: Negócios
Autor: Rodrigo Afonso
Link: http://computerworld.uol.com.br/negocios/2010/06/02/fornecedores-locais-enfrentam-barreiras-a-exportacao-de-servicos/