Marco Civil da Internet prevê neutralidade de rede e guarda de logs

25/08/2011

O Brasil reconhece a internet como uma rede de escala mundial, na qual devem ser respeitados e preservados os fundamentos de direitos humanos, pluralidade, abertura e colaboração. A liberdade de expressão e a privacidade são garantias, assim como a proteção de dados pessoais e a neutralidade da rede.

É o que prevê o projeto do Marco Civil da Internet, que está pronto para ser encaminhado ao Congresso Nacional – fruto de uma iniciativa inovadora do governo brasileiro, que redigiu a proposta com base no ambiente colaborativo da rede mundial. Na prática, permite ao país superar, ainda que temporariamente, as discussões focadas em crimes e penas – cujo exemplo mais expressivo é o PL 84/99 – e dar parâmetros de como o país vê a web.

O projeto é relativamente enxuto em suas seis páginas, com foco em princípios, direitos, deveres e garantias para o uso da rede. Entre eles, o país garante, de um lado, a liberdade de expressão e por outro a proibição de suspensão de conexão à internet, salvo por questões de não pagamento pelo acesso. Foge, portanto, de modelos de leis europeias, como na França e Inglaterra, que permitem a desconexão em casos, por exemplo, de suposta violação de direitos autorais.

A proposta também é importante ao alinhar o Brasil ao princípio de neutralidade de rede – questão que, como visto durante audiência na Anatel nesta semana, desagrada empresas de telecomunicações, que preferem ter o direito de gerenciar o tráfego, inclusive com diferenciação entre o tipo de conteúdo buscado pelos internautas. E diferentemente de proposta em discussão pela agência, tem redação muito mais clara.

Pois diz o projeto em seu artigo 9º que “o responsável pela transmissão, comutação ou roteamento tem o dever de tratar de forma isonômica quaisquer pacotes de dados, sem distinção por conteúdo, origem e destino, serviço, terminal ou aplicativo, sendo vedada qualquer discriminação ou degradação do tráfego que não decorra de requisitos técnicos necessários à prestação adequada dos serviços, conforme regulamentação”.

E para não deixar qualquer dúvida, o parágrafo único daquele artigo emenda ao prever que “na provisão de conexão à Internet, onerosa ou gratuita, é vedado monitorar, filtrar, analisar ou fiscalizar o conteúdo dos pacotes de dados”. Justamente o que as operadoras se queixaram na última terça-feira, durante audiência da Anatel, ao defenderem a possibilidade de tratamento diferenciado a, por exemplo, clientes que costumam baixar vídeos e músicas na rede.

Embora o texto do Marco Civil seja muito mais um parâmetro a ser seguido por legislações específicas, inclusive criminais, ele já toca em pontos importantes que já frequentam tribunais brasileiros. Um deles é o tratamento aos provedores de conexão, que não poderão ser responsabilizados por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros. Além disso, provedores de aplicações só poderão ser responsabilizados nesse caso quando, após ordem judicial, mantiverem disponível o conteúdo irregular.

Outro ponto é o que trata da polêmica guarda dos registros de conexão. Como norma geral, os “administradores de serviços autônomos” deverão manter arquivos de conexões durante um ano, prazo que pode ser dilatado – e cujas informações só podem ser requisitadas – por ordem judicial. A menção aos “administradores de serviços autônomos” é importante, porque isso significa que a guarda de logs cabe para os provedores que atribuem endereços IP, o que deixa de fora, por exemplo, telecentros e lan houses.

A única ressalva nesse ponto é como se dará essa guarda de logs no caso de municípios que disponibilizem acessos abertos, por exemplo, em uma praça ou outro espaço público. Ou escolas e universidades que disponibilizem rede para seus alunos, professores e funcionários.

Por outro lado, o Marco Civil também cria outro parâmetro importante, ao proibir o fornecimento a terceiros dos registros de conexão e de acesso a aplicações de internet, salvo mediante consentimento ou nas hipóteses previstas em lei. Na prática, é a linha de tornar ilegal o comércio de perfis de navegação.

Site:  Convergência Digital
Data: 24/08/2011
Hora: 19h
Seção: Internet
Autores: Luis Osvaldo Grossmann e Luiz Queiroz
Link: http://convergenciadigital.uol.com.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=27411&sid=4