As pressões do mercado tem feito as áreas de TI repensarem suas estratégias de governança e gestão. Principalmente quando falamos da necessidade de trabalhar junto com o negócio no desenvolvimento de inovações em serviços, produtos, processos e modelos de negócio.
Uma destas estratégias é a tão falada TI Bimodal. O termo foi criado pelo Gartner em 2014 e prega a necessidade de termos dois modos de atuação dentro da TI. Um, focado na estabilidade, integração, eficiência (a TI tradicional). Outra, focado na inovação, que tem como características a agilidade e a experimentação (a TI experimental).
Apesar do termo ser novo para a TI, a necessidade de convivência de dois modos distintos já foi explorado em outras áreas. É o caso do conceito de empresas ambidestras, aquelas que conseguem, simultaneamente, ser criativas, inovadoras, eficientes e que ainda, mantém os seus processos estruturados, sem falar em portfólios com estratégias “barbell”, que consiste em deixar a maior parte dos recursos em algo muito conservador, e o restante em algo extremamente frágil, a grosso modo; a ideia é apostar nas postas e evitar o caminho central.
As estratégias tipo “barbell”, que também podem ser entendidas como bimodais, amplamente defendidas por Nassim Taleb, pesquisador na área de tomada de decisões e riscos, autor de diversos livros e artigos, podem nos ajudar a fazer a ponte para um conceito muito mais amplo.
É o conceito da Antifragilidade.
Taleb explica muito bem em seu livro o que é a antifragilidade. “Imagine que você precisa enviar um pacote com coisas frágeis para algum lugar. O que você escreve no pacote? Provavelmente escreverá - Cuidado, Frágil - ou então - Frágil, manuseie com cuidado! Mas a pergunta seguinte é bastante intrigante. Qual o oposto de frágil? A primeira resposta que vem na cabeça das pessoas é “robusto”. Mas será mesmo? Qual o oposto daquela frase que você escreveu no pacote? O oposto seria: “Cuidado, antifrágil, manuseie com descuido!”.
Uma coisa robusta não se importa com a maneira com que você manuseia ela. Uma coisa antifrágil gosta do descuido, da volatilidade, da mudança. Coisas antifrágeis são aquelas que se beneficiam do caos (referência ao título do livro de Nassim Taleb “Antifrágil – Coisas que se beneficiam com o caos”).
Uma TI antifrágil é aquela que se beneficia das constantes mudanças do negócio, dos mercados, da volatilidade, dos ataques de hackers, do tempo.
O conceito de TI antifrágil é muito mais amplo do que o da TI Bimodal. Antifragilidade é uma forma de pensar toda a TI. Os efeitos da complexidade dos ambientes, a exposição a “Black Swan” (Cisnes negros, eventos imprevisíveis), exposição a efeitos positivos inesperados com ganhos exponenciais, etc.
A Bimodalidade é apenas uma tática para fazer que a TI seja um pouco mais antifrágil.
Neste ensaio, não vou explorar todas as implicações do conceito de antifragilidade em TI. Vou me limitar às ideias mais próximas da bimodalidade.
O conceito de estratégias Barbell talvez deixe mais claro a questão da Bimodalidade e nos permita criar estratégias e ações para nos tornar mais antifrágeis. Barbell é aquele equipamento que o levantador de peso usa.
Dois pesos grandes separados por uma barra. Esta visão é importante. Um único contexto (equipamento), com investimentos/esforços (pesos) em posições opostas e equilibradas, que permitem a maximização dos resultados, com uma distância (espaço) que permite que haja manobra entre eles, mas que permite uma distinção clara dos lados. É uma estratégia bem conhecida do mercado financeiro, na gestão de carteiras de investimento.
Para a nossa aplicação em empresas, TI, etc, a ideia é que um lado representa a máxima proteção contra eventos negativos. O outro, levando a máxima exposição (radical) a eventos positivos. Uma receita prática para isso seria: 90% do esforço (ou dinheiro, ou qualquer outra medida) do lado da remoção de fragilidades, 10% do esforço na captura de oportunidades.
Para tornarmos algo (no nossa caso a TI) mais antifrágil podemos começar fortalecendo para o lado conservador (ou tradicional) fazendo a busca e remoção de fragilidades. A diferença em relação à gestão de riscos, habitual na TI tradicional, é sutil, mas muito importante. Na remoção de fragilidades começamos com a pergunta “O que de ruim pode nos acontecer?”. Veja que a pergunta “Não é COMO uma coisa ruim pode nos acontecer?”. Vejamos um exemplo bem simples:
O que de ruim pode nos acontecer?
Boa resposta: Ficarmos com a rede indisponível ou com o sistema x indisponível.
Respostas ruins: Aparecer um bug no roteador que vai derrubar a rede.
Qual a diferença nas duas respostas? Uma, a primeira, foca no efeito. É mais ampla e permite que sejam tomadas várias ações para mitigar o efeito indesejado. A segunda, mais específica é ruim porque trata de um ponto apenas de falha e não dá liberdade para definir outras ações que possam mitigar o efeito indesejado. É praticamente impossível encontrar todos os eventos específicos. É importante ressaltar que devemos buscar respostas que englobem QUAISQUER eventos que queremos evitar.
Encontradas como diminuir nossa fragilidades podemos perguntar “O que podemos fazer para que elas não aconteçam?”. Não tente encontrar soluções específicas, procure respostas amplas. Por exemplo, podemos colocar roteadores redundantes, mudar a estrutura da rede para não depender de um roteador específico, etc. Assim, estaremos menos expostos a qualquer coisa que acontece com o equipamento.
Resumindo, para o lado da TI tradicional, uma estratégia eficiente, para nos tornar mais antifrágeis, é procurar fragilidades e implantar ações que minimizem eventos danosos (quase sempre imprevisíveis e explicados depois que acontecem). Você conhece suas principais fragilidades? Estão escritas em algum lugar ? Qual os seus planos para minimizá-las? As mudanças que você está fazendo no ambiente estão minimizando ou potencializando fragilidades?
E para o outro lado da barra? O que buscamos é maximimizar a exposição a eventos positivos. As palavras aqui são adaptabilidade, aprendizado, velocidade, exposição, prototipagem e principalmente EXPERIMENTAÇÃO. Da mesma forma que é impossível prever coisas negativas, é quase impossível prever o que vai dar certo. Casos de sucesso quase sempre também são explicados depois que acontecem. Se forem analisados a fundo, ninguém sabia a priori como fazer dar certo.
Então como agir? Dedique esforço (10%) para experimentar com agilidade e velocidade. Seja ousado, radical, sem vínculos com a TI tradicional. Com o máximo de risco possível (é isso mesmo). Afinal de contas, 90% está protegido pelo outro lado. Se você perder todos os 10% o impacto é pequeno. No entanto, quando as coisas deste lado da barra dão certo, os ganhos podem ser gigantescos. Basta acertar poucas vezes.
Como colocar isso em prática? Reserve dinheiro, tempo, esforço para trabalhar no desenvolvimento de protótipos. Não tente avaliar no detalhe todos os ganhos possíveis. Simplifique ao máximo (ou elimine) a necessidade de business cases, limite o gasto por protótipo (ter pouco tempo e dinheiro para fazer protótipos aumenta a criatividade), tenha ciclos muito curtos de desenvolvimento (2 semanas). Não penalize o erro bom. Exalte o esforço que foi aplicado nos protótipos que não deram certo porque realmente não tinham potencial – e para os quais deve-se registrar um aprendizado. Priorize com base no que é importante para o negócio. Trabalhe com o pessoal de negócio, pesquisa, converse com seus clientes ou potenciais clientes, estabeleça cenários possíveis, pergunte e aprenda!
Você consegue reservar 10% do seu orçamento ou esforço para EXPERIMENTAR? Quem está experimentando, está fazendo para valer ou está com pensamento de TI tradicional? Quantos protótipos vai fazer este ano? Protótipos para o cliente ou para a TI? Junto com o negócio? E com o potencial cliente? Quem libera o orçamento está pronto para saber que você pode gastar os 10% e não conseguir resultado nenhum resultado financeiro imediato?
O conceito de Bimodalidade da TI é muito importante. Mas, talvez, sua maior implicação esteja no fato de dar um primeiro passo para uma nova visão estratégica das empresas, que levará ao desenvolvimento de TIs antifrágeis.
*Adriano Lima é sócio e diretor da Inmetrics.
Referências:
Antifrágil: Coisas que se beneficiam do Caos, Nassin N. Taleb, Editora Best Business, 2014
A Lógica do Cisne Negro, Nassim N. Taleb, Editora Best Business, 2008
Going Beyond Agility with Antifragility, Ben Linders,http://www.infoq.com/news/2015/02/beyond-agility-antifragility, 2015.
Bimodal IT: How to Be Digitally Agile Without Making a Mess, Mary Mesaglio, Simon Mingay,
https://www.gartner.com/doc/2798217/bimodal-it-digitally-agile-making, 2014.
Site: Computerworld
Data: 29/04/2015
Hora: 8h25
Seção: Gestão
Autor: Adriano Lima
Link: http://computerworld.com.br/ti-bimodal-primeiro-passo-para-uma-ti-antifragil