Marco Civil: Ações contra spams devem ser exceções à neutralidade

02/10/2015

O diretor-presidente do Conselho Executivo da Associação Brasileira de Internet (Abranet), Eduardo Parajo, defendeu na quarta-feira (30/09), em audiência pública na Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara dos Deputados, que o bloqueio de spams e as medidas tomadas pelos provedores no caso de ataques cibernéticos constem no decreto regulamentador do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/14) como exceções ao princípio da neutralidade de rede.

O princípio de neutralidade de rede contido no Marco Civil impede os provedores de internet de interferir no que trafega na rede, ou dar prioridade a tipos de conteúdo ou aplicação. Mas o texto da lei diz que a discriminação ou degradação do tráfego somente poderá decorrer de requisitos técnicos indispensáveis à prestação adequada dos serviços; e da priorização de serviços de emergência.

Na visão de Parajo, as exceções devem ser limitadas na regulamentação, para não virarem regra. Para ele, a regulamentação deve apenas esclarecer o que prevê a lei. “Uma questão que deve estar clara no decreto é que o servidor pode, no caso de ataques cibernéticos, por exemplo, tomar medidas para discriminar tráfego. É uma das exceções”, disse.

O deputado Vinicius Carvalho (PRB-SP) manifestou preocupação nesta quarta-feira (30) com o prazo para a regulamentação do Marco Civil da Internet (12.965/14) e com a efetividade da lei, enquanto o governo não edita o decreto regulamentando-o. O deputado questionou representantes do governo se a lei já protege o consumidor e se a regulamentação vai assegurar a neutralidade de rede plena.

Aprovado no ano passado pelo Congresso, o marco civil define direitos e deveres de usuários e provedores de internet. As regras gerais previstas na lei já estão em vigor, mas agora o governo discute a regulamentação de pontos específicos da norma.

Já foram promovidas três consultas públicas sobre a regulamentação do marco civil - uma pelo Ministério da Justiça, outra pelo Comitê Gestor da Internet (CGI.br) e outra pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), sendo a da Anatel específica sobre neutralidade de rede.

A proposta de regulamentação será enviada por esses órgãos à Presidência da República, que deverá editar decreto regulamentador. O ministério e a Anatel estão em fase de formulação de sua proposta.

O representante da Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Marcelo Chilvarquer, afirmou que o governo tenta conciliar celeridade com participação social.

O órgão finaliza uma proposta de regulamentação e vai submeter esse texto a consulta pública, por 30 dias. “Queremos que esse texto saia o mais rápido possível”, afirmou, sem definir prazo. Posteriormente, essa proposta será encaminhada à Presidência da República, que deverá editar o decreto regulamentando a lei.
Ele afirmou que a neutralidade de rede já está em vigência, e que, nessa fase de regulamentação da lei, estão sendo discutidas as exceções à neutralidade. O marco civil diz que a discriminação ou degradação do tráfego somente poderá decorrer de requisitos técnicos indispensáveis à prestação adequada dos serviços; e da priorização de serviços de emergência.

E estabelece que essas exceções serão regulamentadas pela Presidência da República, ouvidos a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e o Comitê Gestor de Internet (CGI.br).

O conselheiro da Anatel Rodrigo Zerbone informou que a agência fez consulta pública específica sobre a neutralidade de rede, em abril e maio, tendo recebido mais de 100 contribuições. “A fase atual é de avaliação das contribuições e formulação de proposta, ainda neste semestre, para envio à Casa Civil da Presidência da República”, apontou.

Para o conselheiro, o regulamento deve garantir que o gerenciamento de tráfego seja preservado, dando segurança jurídica para que os detentores de rede o façam. Segundo ele, o gerenciamento de tráfego visa, por exemplo, evitar congestionamento, spam ou ataques cibernéticos.

Rodrigo Zerbone salientou ainda que, antes mesmo do Marco Civil da Internet, a Lei Geral de Telecomunicações (9.472/97) já garantia a neutralidade de rede. Conforme ele, a Anatel já atuou para garantir a aplicação do princípio, por exemplo, quando a empresa Brasil Telecom tentou bloquear conteúdos do aplicativo Skype.

O diretor de Regulamentação do Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia (SindiTelebrasil), Alexander Castro, também afirmou que a neutralidade está sendo praticada pelas operadoras, que devem ofertar acesso pleno à internet, sem privilegiar determinados sites ou conteúdos.

“Mas, pela lei, o usuário pode contratar velocidades distintas e volumes distintos”, explicou. Ele disse que a empresa bloqueia o acesso dos usuários à internet apenas quando termina o pacote contratado pelos usuários.

Tarifação zero

O representante das empresas de telefonia também defendeu que a regulamentação do Marco Civil garanta que o usuário possa contratar, por exemplo, controle parental ou bloqueio de propaganda, sem que isso fira a neutralidade de rede.

Alexander Castro também defendeu que a prática do zero rating – ou seja, o acesso grátis a determinados aplicativos – não fere a neutralidade de rede. Por essa prática, a operadora pode fazer promoções como a de oferta de WhatsApp gratuito a seus clientes, por exemplo. O vice-presidente da Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico (Câmara E-net), Leonardo Palhares, também acredita que a tarifação zero não fere necessariamente a neutralidade de rede. “Zero rating é opção democratizante, desde que não ofereça restrições à experiência do usuário ao acessar a internet”, ressaltou.

Direitos autorais

Alguns debatedores defenderam que seja discutido, na fase da regulamentação da lei, o bloqueio de sites por violação de direitos autorais. Foi o caso do diretor geral da Motion Picture Association América Latina, Ricardo Castanheira, e do coordenador da Comissão de Estudo de Direitos Autorais e Direitos da Personalidade da Associação Brasileira da Propriedade Intelectual (ABPI), Fábio Luiz Pereira.

O Marco Civil da Internet prevê que a retirada de conteúdos que violem direitos autorais ocorra na forma da lei atual de direitos autorais (Lei 9.610/98) – ou seja, só por ordem judicial.

Mas, para esses debatedores, o bloqueio desses sites sem necessidade de intervenção da Justiça deve entrar na regulamentação como uma exceção à neutralidade de rede.

Violação à privacidade


Para o professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) Carlos Affonso Souza Souza, o bloqueio de sites por violação de direitos autorais sem ordem judicial é ineficaz, institucionaliza a violação à privacidade e fere o princípio da neutralidade de rede.

Segundo ele, isso deve ser discutido no âmbito da reforma da lei de direitos autorais no Brasil. “O tema é importante, mas deve ser debatido no fórum pertinente”, destacou.

*Com informações da Agência Câmara.

 

Site: Computerworld
Data: 01/10/2015
Hora: 11h12
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