Pressão por resultados eleva o valor da transformação digital

01/02/2016

São Paulo - O ano de 2016 será marcado pela adequação das empresas à terceira plataforma tecnológica, baseada na computação em nuvem e nas oportunidades criadas por ela. Além de sustentar o crescimento do setor de TI, a transição será um diferencial competitivo na superação do período de retração, quando orçamentos enxutos pressionarão ainda mais departamentos de tecnologia.

De acordo com previsões da consultoria IDC Brasil, 54% das grandes ou médias empresas brasileiras pretendem, em 2016, iniciar ou acelerar movimentos de transformação digital. Relativamente novo, mas cada vez mais comum mesmo no cotidiano de empresários de pequenas, o conceito engloba a computação em nuvem (cloud computing), aplicações móveis, a coleta e análise de grandes volumes de dados (big data) e as tecnologias sociais, que têm na interação humana a sua fonte.

"São quatro ferramentas de grande sinergia, capazes de uma convergência transformadora nos negócios", avalia o analista e vice-presidente de pesquisa da consultoria Gartner, Cássio Dreyfuss. O coordenador de pesquisa de software da IDC Brasil, Luciano Ramos, vai pela mesma linha. "Novos modelos vão ter uma ênfase maior, com muitas empresas criando áreas e unidades completamente digitais, baseadas em inteligência e entrega rápida", argumenta.

As melhorias serão bem-vindas, sobretudo em um cenário como o nacional, em que a cobrança por resultados sobre departamentos de tecnologia tende a crescer. "A pressão por redução de budget vai pedir uma demonstração de retorno sobre TI", conjectura o gerente de consultoria e pesquisas do IDC Brasil, Pietro Delai.

Segundo ele, conceitos antes restritos às áreas de negócios, como o ROI (return on investment, ou retorno de investimentos), vão se tornar mais presentes. "Há um desejo que TI se torne custo variável, e a computação em nuvem pode fazer isso", completa Delai.

Um estudo global de outra consultoria especializada - a Capgemini - avaliou o andamento da transformação digital no mundo e seu impacto sobre os negócios. A constatação foi que apenas 7% das companhias podem ser consideradas integralmente digitais, enquanto 16% estão com o processo estagnado - os 77% restantes estariam em transição.

"A modificação dos modelos tradicionais será complexa, mas não temos escolha se quisermos tirar o máximo dessa revolução digital", argumenta o vice-presidente sênior de transformação digital da Capgemini Consulting, Didier Bonnet.

Entre resultados apontados pelo levantamento está a percepção de que empresas já adequadas têm maior capacidade de encontrar parceiros (80%), identificar tendências (67%) e atender desejos específicos de clientes (73%), que suas rivais ainda amparadas pela segunda plataforma da informática (que tem a computação pessoal como peça central) somaram índices de 17%, 15% e 10%, respectivamente.

Gestores

"No Brasil não falta vontade nem capacidade de se adequar, mas estamos atrasados por uma questão simples: orçamento", avalia Dreyfuss, da Gartner. Segundo o analista, a desvalorização do real ante o dólar pode dificultar a tomada de decisão, já que os maiores players do mercado são estrangeiros - há também soluções nacionais, mas menos robustas.

Ao mesmo tempo, a alta da moeda norte-americana pode despertar o interesse de novos players do setor, que podem entrar no País a partir deste ano. "Se lá fora o cloud computing já está consolidado, aqui no Brasil ainda estamos amadurecendo. Empresas que ainda não estão presentes devem vir nos próximos 12 ou 24 meses", avalia o consultor Pietro Delai.

Uma transformação plena, contudo, passa também pela atualização dos profissionais. "O CIO [sigla de chief information officer ou diretor de tecnologia] tradicional, que trabalhava só de olhos nas máquinas, vai perder espaço para outro que tenha esse movimento de transformação em sua mentalidade", avalia Luciano Ramos.

"O CIO brasileiro é muito técnico, e isso foi valorizado durante 40 anos, mas agora que o mundo está subindo para a nuvem, muitas de suas competências perderam importância", avalia Cássio Dreyfuss - que creditou o receio de ser "deixado para trás" como motivo que atrapalha a transformação digital em um grande número de empresas. "O profissional sabe que no momento que fizer o outsourcing [ou terceirização de processos], ele pode perder valor", completa.

A tendência é de mudança na formação dos profissionais que vão liderar a entrada na terceira plataforma, com um maior foco em profissionais versados em negócios e gestão. Segundo os especialistas ouvidos pelo DCI, a formação superior em informática ainda não incorporou todos conceitos que devem ser importantes para a área nos próximos anos.

O surgimento de novos postos visando o momento de transição - como o conselheiro digital, que começa a surgir dentro de conselhos executivos - também está acontecendo.

Contraponto

De acordo com previsões do IDC, o investimento das empresas brasileiras em computação em nuvem deve superar os 20% em 2016, sendo assim o maior responsável pela estimativa de crescimento de 2,6% projetada para o setor.

O crescimento vai aumentar a potência de indagações como as vinculadas à nuvem pública - que deve ser mais demandada devido a seu custo menor. A principal delas trata da governança corporativa da estrutura.

O avanço dos investimentos em analytics (que, segundo o IDC, deve movimentar R$ 811 milhões no País) e das tecnologias sociais também deve ter suas contrapartidas. Uma delas é o aumento nos gastos com a segurança dos dados coletados: a participação deles no orçamento de TI das empresas deve representar 2% do total, de acordo com o IDC.

O retorno lento em projetos de business intelligence (BI)e analytics também pode ser uma barreira. "Projetos de curto prazo devem ter mais sucesso", avalia Luciano Ramos. Já Cássio Dreyfuss contrapontua: "Não dá para mudar o prazo de maturação do BI, eles são muito longos. Conheço empresas grandes que ainda fazem o BI no Excel porque um dos requisitos para investirem é o payback (retorno) em 18 a 24 meses. Em BI isso nunca acontece".

A privacidade de dados pessoais é outro tema que deve emergir com o avanço dos sensores acoplados em utensílios domésticos - um dos pilares da internet das coisas. "São discussões seriíssimas e que o Brasil nem começou", afirma Dreyfuss. Atualmente, três projetos sobre o assunto tramitam no Legislativo e sob o chapéu do Ministério da Justiça. Nenhum tem previsão de aprovação.

Henrique Julião

 

Site: DCI
Data: 01/02/2016
Hora: 5h00
Seção: Tecnologia
Autor: Henrique Julião
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Link: http://www.dci.com.br/em-destaque/pressao-por-resultados-eleva-o-valor-da-transformacao--digital-id525012.html