Goldman Sachs agora dá aos clientes seu software mais valioso

12/09/2016

Criado há 25 anos, um software que já ajudou o Goldman Sachs Group Inc. a ganhar bilhões de dólares em operações realizadas na hora certa e a evitar outros bilhões em prejuízos continua sendo a principal ferramenta do banco de investimento americano para avaliar o risco e analisar os preços de ativos mobiliários.

Chamado Securities DataBase (algo como Banco de Dados de Valores Mobiliários, em tradução livre), ou SecDB, o sistema, que calcula 23 bilhões de preços em 2,8 milhões de posições diariamente, já teve um papel crucial em muitos momentos importantes da história recente do banco, inclusive nos controversos negócios realizados imediatamente antes da crise financeira.

O Goldman o manteve bem protegido, rejeitando ofertas de rivais como o alemãoDeutsche Bank AG para licenciar o banco de dados. “Era uma bela vantagem competitiva”, disse recentemente Gary Cohn, diretor operacional do Goldman desde 2006.

Por isso, talvez não exista sinal mais claro das mudanças ocorridas em Wall Street do que esse: recentemente, o Goldman começou a ceder a seus clientes as ferramentas que o tornaram uma potência nas negociações de mercado — e de graça.

As razões do banco não são altruístas; na verdade, muitas das vantagens que já tornaram os operadores do Goldman temidos e admirados desapareceram. Novas regras impostas pelos reguladores limitaram os riscos das negociações dos bancos e tornaram caro manter um grande volume de ações e títulos em suas carteiras de investimentos. Além disso, as negociações eletrônicas espremeram as margens e reduziram o movimento dos pregões de Wall Street.

“A regulação eliminou aquela vantagem”, diz Peter Carr, que já foi executivo do bancoMorgan Stanley e hoje é professor da Universidade de Nova York.

Operadores e executivos usam o SecDB para obter informações de como precificar ativos e como o valor deles pode mudar conforme uma das milhares de variáveis possíveis. Esses dados podem ser usados para analisar potenciais operações e, depois, monitorar os riscos das posições assumidas.

O que tornou o software invejado em Wall Street, contudo, foi a capacidade de inclusão de novas classes de ativos, novas mesas de operação, até áreas de negócios inteiras. E os dados que ele aglomera estão todos em um único lugar. Megafusões deixaram instituições rivais com uma mescla de diferentes sistemas e diferentes facções de empregados fiéis a cada um deles. O Goldman evitou grandes aquisições, livrando-se dos problemas que reduziriam sua capacidade de avaliar riscos rapidamente.

A nova estratégia do Goldman é disponibilizar sua tecnologia para conquistar mais negócios de clientes. Muitas das ferramentas estão sendo oferecidas na forma de aplicativos colocados na internet que os clientes podem customizar e operar sozinhos.

“São conteúdos, ferramentas e análises que construímos durante décadas e estamos colocando nas mãos dos clientes”, diz R. Martin Chavez, diretor de tecnologia da informação do banco.

Alguns investidores e clientes têm dúvidas de que o Goldman possa se transformar tanto. “Não tenho certeza se sua especialidade principal é ser uma empresa de tecnologia”, diz Jason Brady, diretor-presidente da gestora Thornburg Investment Management, que administra US$ 55 bilhões e opera com o Goldman.

Será vital para o Goldman conquistar clientes como Jeffrey Young, um dos líderes de investimentos da gestora Ramius LLC.

Uma vendedora do Goldman apresentou o aplicativo Marquee para Young durante um período agitado nos mercados, quando ele precisava de atualizações regulares de derivativos que havia comprado do Goldman.

“Eles estão tentando ser mais proativos — em vez de apenas dizer ‘nós precisamos satisfazer o que os clientes querem’, eles estão dizendo ‘vamos ter certeza de que eles estão tão felizes quanto possível’”, diz Young.

Mas o Goldman está buscando um nicho num setor já abarrotado. A gigante da administração de ativos BlackRock Inc. oferece seu próprio sistema de gestão de riscos, chamado Aladdin, e os terminais da Bloomberg LP continuam onipresentes nas mesas de operação.

Chavez, o diretor de TI do Goldman, veio da J. Aron, braço de negociação de commodities que o Goldman adquiriu em 1981. Outros líderes do Goldman começaram lá, como o diretor-presidente Lloyd Blankfein e Cohn, seu principal diretor.

Foi uma equipe de engenheiros contratada para trabalhar em modelos de computadores na J.Aron que criou o sistema SecDB. Em 1993, Chavez foi contratado para ampliar sua utilização na mesa de commodities da J. Aron.

O sistema passou por um teste inicial em 1998, quando o fundo de hedge Long-Term Capital Management quase quebrou. O Goldman usou o banco de dados para analisar sua exposição ao fundo, um episódio que ajudou a elevar o perfil do SeDB dentro do banco, dizem pessoas a par do assunto.

Com o tempo, o SecDB se espalhou para todas as áreas da J.Aron e, quando o mercado imobiliário atingiu o auge, a SecDB já havia chegado aos departamentos de risco e financeiro do Goldman.

Quando os preços dos ativos ligados às hipotecas de maior risco (as chamadas “subprime”) começam a cair, no fim de 2006, os executivos usaram o sistema para avaliar as posições do banco e logo notaram que havia algo errado. O Goldman, então, fez apostas lucrativas contra o mercado imobiliário e, em alguns casos, começou a reduzir a exposição a outras instituições, ainda que outras firmas e clientes continuassem otimistas. (Mais tarde, os atos do banco foram apontados como prova de que ele colocou seus interesses acima dos de seus clientes.)

Hoje, o ponto principal da estratégia de Chavez é o Marquee, uma série de aplicativos que permite que os clientes acessem o SecDB e outros sistemas.

Um aplicativo chamado Simon oferece uma plataforma que corretores independentes podem customizar para comprar títulos estruturados. Outro, o Athena, permite que os clientes corporativos do Goldman executem seus próprios programas de recompra de ações.

Os engenheiros do banco também estão construindo um armazém de dados que irá estocar todas as informações produzidas internamente em apenas um local, chamado de “lago de dados”. O projeto é a resposta do Goldman às análises de dados de clientes, as quais têm revolucionado setores que vão desde a publicidade até o varejo.

“O Goldman ainda tem uma estratégia e uma próxima onda de desafios competitivos”, diz Michael Dubno, ex-executivo do banco e um dos primeiros a trabalhar no desenvolvimento do SecDB, 25 anos atrás.|

Fonte: The Wall Street Journal via Valor Econômico
Data: 08/09/2016
Hora: 00h30
Seção: ------
Autor: Justin Baer
Foto: ------
Link: http://br.wsj.com/articles/SB10600387558273584123304582300340091779590?tesla=y