O setor financeiro evolui a olhos vistos, década a década. No Brasil, a interoperabilidade entre os bancos é invejável, temos um sistema regulatório robusto e os investimentos em tecnologia aumentam a cada ano, mas, apesar disso, a terminologia usada para descrever algumas novidades no setor pode causar certa confusão. Dentre as palavras de ordem ouvidas no setor financeiro, nos últimos anos, que incluem digitalização, blockchain, plataforma, transformação, cripto-moedas, biometria,omnichannel, temos a mais famosa de todas...disrupção!
Mais do que apenas palavras de ordem, muitos destes termos representam o que muitos banqueiros tradicionais acreditam como mudança do ecossistema de toda uma indústria. 'Challenger Banks', FinTech Startups e até mesmo grandes gigantes da tecnologia estão se posicionando para estar no centro dessa mudança, muitas vezes aproveitando estes termos como parte de suas declarações de missão corporativa.
Para tentar encontrar o mecanismo de mercado que está por trás desta avalanche de terminologias usadas pelas FinTechs, experimente usar seus óculos de realidade virtual. Verá que o resultado pode ser revelador! A "disrupção" é muitas vezes mais uma "distração", que trabalha em benefício dos novos operadores no mercado.
O ruído é muito mais alto do que a realidade no mercado. E, em meio a essas distrações, muitos bancos estão esquecendo suas vantagens competitivas e estão culpando as FinTechs pela sua inatividade e inabilidade.
Então, quais são as cinco maiores distrações criadas no novo mercado financeiro?
Distração #1 - É tudo sobre tecnologia
A questão principal não é sobre tecnologia, mas sobre o que a tecnologia cria. Banqueiros não precisam entender profundamente as tecnologias emergentes para perceber que as regras originais de negócio permanecem as mesmas. Os bancos precisam de pessoas criativas e talentosas, que possam sincronizar as novas tecnologias com os seus objetivos de negócio; porque o novo consumidor digital precisa de serviços mais rápidos e mais convenientes, utilizando a internet ou o seu smartphone.
A maioria dos novos negócios não é mais gerado pela interação física. Em vez de trazer os clientes aos pontos de contato físico, os bancos têm que mesclar uma grande variedade de ecossistemas financeiros e não financeiros com um espaço de negócios seguro e fácil de usar, em benefício da sua atual (e futura) base de clientes. Uma experiência do consumidor reforçada é o alfa e ômega da nova era do sistema financeiro…, não é a tecnologia. Bancos precisam fazer o que fazem melhor, com novas ferramentas e oportunidades, sem fronteiras e sem distrações.
Distração # 2: Os clientes estão migrando para FinTechs
O mercado está cheio de FinTechs que inventaram uma ou duas soluções digitais, para aliviar a dor gerada pela falta de serviços financeiros amigáveis ??aos clientes modernos. Mas a maioria delas não têm uma gama completa de serviços financeiros e não conseguem atender em alta escala. Muitas estão perdendo a vantagem inicial de mercado, porque não têm o capital ou conhecimento de marketing para atingir um grande número de clientes. Ou, então, porque não podem manter as promessas que fizeram devido a planos de negócios excessivamente agressivos. O primeiro banco digital alemão,o Number26, teve que começar a fechar algumas contas quando o seu modelo de serviços “gratuitos” aos clientes não funcionou como o planejado. O Nubank, FinTech mais aclamada do Brasil, acabou de anunciar um aumento na taxa de juros e não consegue dar vazão a todos os pedidos de novos clientes que recebe. E isto pode ser apenas o início!
Distração # 3: Os bancos tradicionais não conseguem reagir rapidamente
Não há como negar que os bancos tradicionais têm sistemas legados antigos, lentos, incompatíveis entre si e processos manuais excessivamente complicados e baseados em papel. O sistema existente tem funcionado há mais de três décadas e é impossível desligar tudo e começar de novo. Para a maioria das instituições, esta é apenas uma desculpa para não fazer nada. O problema muitas vezes não é o investimento em novas tecnologias, não é a visão do que é necessário fazer, nem mesmo as pessoas envolvidas. Em vez de construir interfaces pobres para os clientes em um sistema legado ruim, a maioria das organizações sabe que se beneficiariam de um novo backoffice.
Qual é o desafio então? Provavelmente, o impacto final de uma transformação digital completa. Sabemos que um banco digital pode ser criado com algumas centenas de pessoas em um único escritório. E, se bem feito, a redução nos custos de RH e escritórios ultrapassaria 50%. Qual CEO de um banco promoveria este corte de funcionários e de ativos?
Neste âmbito, os bancos tradicionais têm uma vantagem. Eles contam com recursos financeiros para o desenvolvimento e uma base de clientes que se move devagar. A letargia da maioria dos clientes atuais é bem conhecida. Então, por que não construir um novo backoffice, enquanto o antigo sistema ainda está em execução? Uma nova plataforma de banco digital com recursos de ponta e com oportunidade para geração de mais oportunidades de negócio. Ainda há tempo!
Distração # 4: Um banco digital deve ser 100% 'novo'
Assim como em Woodstock e na revolução sexual, ir contra as normas simbolizava liberdade, os novos bancos digitais estão dispostos a negar qualquer coisa que possa lembrar aos consumidores os 'bancos tradicionais ". Como na era Woodstock, asstartups digitais também estão criando nomes irreconhecíveis como os hippies fizeram com seus filhos.
A maior desvantagem de uma FinTech é não ter uma imagem de banco confiável e com uma grande base de clientes existentes. As pesquisas têm mostrado que os maiores bancos tradicionais, com uma boa plataforma de mobile banking, geram maior índice de satisfação do cliente. Enquanto as FinTechs precisam se diferenciar com nomes atraentes como Neon, Simple, Digio, Frank, Mondo, Atom, Tandem, Fidor, Nubanketc, os bancos tradicionais devem alavancar sua marca e sua reputação existente.
Por que reinventar uma versão digital de um banco já estabelecido, quando você pode simplesmente reinventar a experiência para o cliente? Tentar iniciar um novo banco com uma nova marca a partir do zero é uma distração para um banco tradicional. Use suas forças e melhore a experiência digital!
Distração # 5: Ser social!
As redes sociais abriram o mundo de conexões e interações remotas; mas isso não significa que os consumidores querem ser "amigos" do seu banco ou usar as redes sociais para facilitar as transações bancárias. Enquanto muitas FinTechs estão usando as mídias sociais para discutir sua "visão do futuro" ou utilizando as pessoas para financiar seus negócios (o famoso crowdfunding), os bancos tradicionais podem construir relacionamentos através de comunicações diretas, porque eles já têm uma base de clientes.
Ao mesmo tempo que a rede social é uma ferramenta poderosa para lidar com questões de serviço ou reforçar o marketing e novas iniciativas, este canal também pode ser uma grande distração. A priorização das redes sociais é um dos melhores exemplos de como uma distração pode ser confundida com uma oportunidade de disrupção.
No lugar de ter como objetivo "criar disrupção", os bancos tradicionais deveriam construir a partir de suas atuais soluções bancárias, alavancando novas tecnologias e potenciais oportunidades de parceria com FinTechs. As vantagens da era digital serão as entregas de produtos e serviços bancários a um custo menor para o banco e para o consumidor, com um design mais simples, mais fácil e mais contextual. Um novo banco digital pode incluir serviços não financeiros para satisfazer as necessidades do consumidor digital, mas ele só vai ser criado pelas organizações bancárias que não se distraírem exageradamente com a disrupção das FinTechs.
(*) Leandro Duran é Arquiteto de Soluções da CI&T
Fonte: CIO
Data: 23/09/2016
Hora: 15h58
Seção: Opinião
Autor: Leandro Duran
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Link: http://cio.com.br/opiniao/2016/09/23/fintechs-ameaca-ou-distracao/