Fiscalização do FGTS contraria Reforma Trabalhista

28/05/2018

No dia 21/05/2018, foi publicado no Diário Oficial da União a Instrução Normativa nº 144/2018 do Ministério do Trabalho a qual dispõe sobre a fiscalização do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS e das Contribuições Sociais previstas na Lei Complementar nº 110/2001.

O problema é que vários dispositivos desta instrução normativa contrariam o disposto na Lei nº 13.467/2017, mais conhecida como Lei da Reforma Trabalhista. Tais contradições podem gerar riscos e eventuais prejuízos para as empresas já que podem levar a incidência de FGTS sobre verbas as quais a Lei nº 13.467/2017 retirou a natureza salarial e, consequentemente, a incidência do FGTS. As contradições estão especialmente nos incisos X, XIV e XV do artigo 9º e nos incisos XIV, XVI, XXVIII e XXIX do artigo 10º dessa instrução normativa em oposição ao disposto no artigo 457 da CLT, já considerando as alterações feitas neste artigo pela Lei nº 13.467/2017.

Primeiramente, vejamos o que diz os dispositivos da Instrução Normativa nº 144/2018 citados acima:

Art. 9º Consideram-se de natureza salarial para fins do disposto no art. 6º, as seguintes parcelas, além de outras identificadas pelo caráter de contraprestação do trabalho:

X - as diárias para viagem, pelo seu valor global, desde que não haja prestação de contas do montante gasto;

XIV - as gratificações legais, as de função e as que tiverem natureza de contraprestação pelo trabalho;

XV - ajuda de custo, quando paga mensalmente, pelo seu valor global, se ultrapassar o limite de cinquenta por cento da remuneração mensal, mesmo que recebida exclusivamente em decorrência de mudança de localidade de trabalho do empregado, na forma do art. 470 da CLT;

Art. 10. Não integram a remuneração, para fins do disposto no art. 6º:

XIV - ajuda de custo, quando paga mensalmente, limitada a cinquenta por cento da remuneração mensal, recebida exclusivamente em decorrência de mudança de localidade de trabalho do empregado, na forma do art. 470 da CLT;

XVI - diárias para viagem, desde que comprovada sua natureza indenizatória;

XXVIII - prêmios, pagos até duas vezes ao ano, compreendidos como parcelas pagas por liberalidade e em razão de desempenho superior ao ordinariamente esperado no exercício das atividades do empregado, originados a partir de 11 de novembro de 2017, data de início da vigência da Lei nº 13.467/2017;

XXIX - abonos originados a partir de 11 de novembro de 2017, data de início da vigência da Lei nº 13.467/2017, desde que não sejam pagos como contraprestação pelo trabalho;

Agora vejamos o artigo 457 da CLT antes e depois das alterações da Lei da Reforma Trabalhista:

 Artigo 457 da CLT ANTES da Lei da Reforma Trabalhista

 Artigo 457 da CLT DEPOIS da Lei da Reforma Trabalhista

Art. 457 Compreendem-se na remuneração do empregado, para todos os efeitos legais, além do salário devido e pago diretamente pelo empregador, como contraprestação do serviço, as gorjetas que receber.

Não houve alteração no caput

§ 1º - Integram o salário não só a importância fixa estipulada, como também as comissões, percentagens, gratificações ajustadas, diárias para viagens e abonos pagos pelo empregador.

§ 1º Integram o salário a importância fixa estipulada, as gratificações legais e as comissões pagas pelo empregador.

§ 2º - Não se incluem nos salários as ajudas de custo, assim como as diárias para viagem que não excedam de 50% (cinquenta por cento) do salário percebido pelo empregado.

§ 2º As importâncias, ainda que habituais, pagas a título de ajuda de custo, auxílio-alimentação, vedado seu pagamento em dinheiro, diárias para viagem, prêmios e abonos não integram a remuneração do empregado, não se incorporam ao contrato de trabalho e não constituem base de incidência de qualquer encargo trabalhista e previdenciário.

Não existia o §4º

§ 4º Consideram-se prêmios as liberalidades concedidas pelo empregador em forma de bens, serviços ou valor em dinheiro a empregado ou a grupo de empregados, em razão de desempenho superior ao ordinariamente esperado no exercício de suas atividades.


Vejamos agora as contradições:

Ajuda de Custo

Antes da Lei da Reforma Trabalhista, se a ajuda de custo ultrapassasse 50% do valor do salário, teria natureza salarial, consequentemente, incidiria FGTS. APÓS a Lei da Reforma Trabalhista, foi retirada a limitação à 50% do salário, sendo assim, não importa se a ajuda de custo concedida é maior que 50% do salário, NÃO terá natureza salarial, logo não incidirá FGTS. Sendo assim, o inciso XV do artigo 9º e o inciso XIV do artigo 10º da Instrução Normativa nº 144/2018 contraria a alteração feita pela Lei da Reforma Trabalhista no §2º do artigo 457 da CLT.

Diárias para Viagens

O §2º do artigo 457 da CLT tanto antes quanto após a Lei da Reforma Trabalhista nunca exigiu que no pagamento de diárias para viagens houvesse prestação de contas do montante gasto. Isto porque a prestação de contas ocorre no reembolso de despesas e não nas diárias para a viagem. Sendo assim, há uma contradição no inciso X do artigo 9º e no inciso XVI do artigo 10º da Instrução Normativa nº 144/2018.

Gratificações Ajustadas

Após a Lei da Reforma Trabalhista, somente as gratificações legais tem natureza salarial e, portanto, incidência de FGTS. Sendo assim, no caso por exemplo, de uma gratificação ajustada, tenha ou não natureza de contraprestação pelo trabalho, não terá natureza salarial, logo, não incide FGTS. Sendo assim, o inciso XIV do artigo 9º da Instrução Normativa nº 144/2018 contraria a alteração feita pela Lei da Reforma Trabalhista no §1º do artigo 457 da CLT.

Prêmios

Antes da Lei da Reforma Trabalhista, os prêmios possuíam natureza salarial, logo, incidia FGTS sobre os prêmios pagos aos empregados. A Lei da Reforma Trabalhista alterou o §2º da CLT prevendo expressamente que prêmio não possui natureza salarial. Além disso, a Lei da Reforma Trabalhista também incluiu no artigo 457 da CLT o §4º o qual traz uma definição sobre prêmio. Não há nesta definição, nenhuma limitação em relação a quantidades de vezes que o prêmio pode ser pago no ano sem que haja natureza salarial e, portanto, incidência do FGTS. Portanto, há uma contradição no inciso XXVIII do artigo 10º da Instrução Normativa nº 144/2018 ao dizer que só não incide FGTS se o prêmio for pago no máximo 2 vezes no ano.

Abono

Antes da Lei da Reforma Trabalhista, os abonos possuíam natureza salarial, logo, incidia FGTS sobre os abonos pagos aos empregados. A Lei da Reforma Trabalhista alterou o §2º da CLT prevendo expressamente que abono não possui natureza salarial. Inclusive não há limitação quanto ao porquê da concessão do abono, ou seja, não importa se o abono foi ou não concedido como contraprestação pelo trabalho, não haverá incidência de FGTS. Porém não é isso que determina o inciso XXIX do artigo 10º da Instrução Normativa nº 144/2018, causando, assim, mais uma contrariedade.

Observação: algumas das limitações previstas na Instrução Normativa nº 144/2018, como, por exemplo, ajuda de custa limitada a 50% do salário e prêmios pagos no máximo duas vezes ao ano estavam previstas na Medida Provisória nº 808/2017. Ocorre que esta MP não foi transformada em lei, a mesma perdeu a eficácia. Sendo assim, as alterações que essa MP propunha só podem ser feitas por meio de lei. Atos infralegais, como é o caso de uma instrução normativa, não tem competência para alterar o disposto na lei.

Por: Luiza Paula Gomes, advogada do TI Rio