Os curiosos sobreviverão ao Futuro do Trabalho

29/10/2018

O universo do trabalho vem passando por grandes mudanças e de forma acelerada. As teses sobre extinção de empregos e oportunidades do mercado de trabalho brotam quase que diariamente. Algumas são sombrias, apontam para demissões em massa com a substituição de pessoas por máquinas e robôs em larga escala. Outras são mais otimistas e mostram caminhos e espaços para novas profissões e negócios.

Em razão disso, o termo Futuro do Trabalho tem sido amplamente utilizado para tratar dessa temática. As atividades profissionais e estruturas organizacionais estão mudando rapidamente, assim como os modelos de ascensão vertical na carreira. A imprevisibilidade dos negócios altera a lógica de sequenciamento de cargos. Não há mais plano de carreira na empresa. É papel do indivíduo explorar alternativas e estar pronto para oportunidades que surgirem, sem prazo ou alvo fixo. Não há mais um cargo definido por meio de uma evolução linear, como tínhamos no passado. O plano precisa ser construído pelo indivíduo para desenvolver sua prontidão e aproveitar as possibilidades de trabalho.

Recentemente, a cientista comportamental ítalo-americana e professora da Harvard Business School, Francesca Gino, publicou um artigo apontando a relevância da curiosidade para a carreira neste novo cenário. A especialista destaca que essa competência será a mais relevante para atingir resultados e crescer profissionalmente.

O levantamento realizado por Francesca com mais de três mil profissionais de diversas empresas e setores destacou inúmeros benefícios que a curiosidade pode causar na carreira. Um deles é errar menos na tomada de decisão, além de aumentar os níveis de inovação e da capacidade de explorar possibilidades de carreira e de reduzir conflitos em grupo.

Já o pesquisador e uma das maiores autoridades mundiais em aconselhamento profissional, Mark Savickas, desenvolveu alguns conceitos sobre adaptabilidade de carreira. Fazendo uma relação entre teorias, o conceito darwiniano, migrado para o mundo dos negócios, trata da prontidão das pessoas para se adaptar às mudanças com menos dificuldade e, portanto, sobreviverem neste mundo em transformação.

A essência da adaptabilidade de carreira está no protagonismo que o indivíduo deve ter sobre sua vida profissional. Pessoas com baixo controle sobre seu futuro tendem a ter mais dificuldade de se adaptar. São profissionais que só vivem o hoje. Tomam decisões sem medir o impacto no futuro e esperam que as empresas os carreguem. Delegam suas carreiras ao mundo. Na outra ponta, são ainda poucos os que possuem maior gestão sobre seus rumos profissionais e que, por consequência, fazem escolhas com maior êxito.

Entre as competências desenvolvidas por Savickas sobre a adaptabilidade de carreira, a curiosidade é um dos destaques. As empresas vêm reduzindo suas estruturas em um ambiente de negócios altamente competitivo. O número de níveis hierárquicos caiu drasticamente nos últimos anos. Buscando eficiência e eliminação de custos, elas cortaram cargos e ajustaram sua arquitetura organizacional.

Isso nos leva a duas conclusões. A primeira é que as possibilidades de crescimento linear são mais escassas. Não existem tantos cargos e movimentos ascendentes como no passado. Já a segunda delas é que o profissional precisará fazer mais movimentos laterais e buscar crescimento que não seja apenas a promoção tradicional de cargo. Isso exige exploração ativa. É a competência da curiosidade. Na prática, significa pesquisar alternativas na empresa, questionar possibilidades e estar aberto a novas experiências.

Nesse cenário, a busca por um diálogo de carreira entre líder e sua equipe será fundamental. Entender os desejos e as ambições do profissional e a conexão com o projeto empresarial serão cada vez mais necessárias. É neste momento que a competência de exploração ativa é essencial. Investigar alternativas, discutir possibilidades de carreira e navegar nesse ambiente menos estruturado são desafios para os profissionais do século XXI.

Uma pesquisa conduzida pela professora Francesca revelou que, em muitas situações, a alta gestão da empresa bloqueia a curiosidade de seus times porque tem uma noção equivocada sobre exploração. Acha que o excesso de questionamentos pode gerar desalinhamento ou dificultar a gestão, tornando as decisões lentas. Neste universo de respondentes do estudo, apenas 24% se sentiam "autorizados" para fazerem perguntas e explorarem alternativas em suas empresas.

Nesse mesmo levantamento, foram entrevistados 520 líderes de alta gestão. E, quando questionados sobre a importância do tema, 92% afirmaram que a curiosidade é um fator preponderante no trabalho. Porém, a maior parte deles não consegue encorajar seus colaboradores a praticar a exploração ativa.

O desafio é enorme. De um lado incentivarmos colaboradores a assumirem seu protagonismo e a explorarem possibilidades. Do outro, preparar líderes que sejam capazes de lidar com questionamentos e saibam gerir de forma mais aberta. Afinal, mais do que falarmos sobre robôs, indústria 4.0 e novas profissões, teremos que mudar para um modelo mental que permita caminhar neste novo cenário.

Rafael Souto é sócio-­fundador e CEO da Produtive Carreira e Conexões com o Mercado

* Com informações do Valor Econômico

Data: 25/10/18
Hora: 05h
Seção: Carreira
Autor: Rafael Souto
Foto: ------
Link: https://www.valor.com.br/carreira/5947535/os-curiosos-sobreviverao-ao-novo-mundo-do-trabalho