Organizações do terceiro setor na área de C&T são essenciais para o desenvolvimento do país

30/03/2009

Presidente da SBPC destaca que “diminuir a capacidade de gestão dessas entidades é matar o futuro da sociedade brasileira”

As fundações de apoio às universidades, bem como as Oscip (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público) e as OS (Organizações Sociais) que se dedicam à área de ciência, tecnologia e inovação (CT&I), estão sofrendo restrições em seu funcionamento, o que resultará em graves entraves para o desenvolvimento econômico e social do país.

O alerta foi feito pelo presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Marco Antônio Raupp, durante audiência pública realizada nesta quinta-feira, dia 26, na Câmara dos Deputados, em Brasília.

O encontro, solicitado pelo deputado Rodrigo Rollemberg, foi promovido pela Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática, com o objetivo de discutir as relações entre as instituições públicas de ensino superior e de pesquisa no Brasil e suas fundações de apoio.

Recentemente, o Tribunal de Contas da União (TCU), por meio do acórdão 2731/2008, indicou um extenso rol de recomendações para todo o universo das fundações de apoio, restringindo a atuação delas e, com isso, impedindo que cumpram seu papel de auxiliar as universidades em atividades de pesquisa científica e tecnológica e de extensão de serviços à comunidade.

Apesar de o acórdão do TCU ser focado nas fundações de apoio às universidades, o presidente da SBPC entende que a “atitude restritiva se estende a todas as organizações da sociedade civil sem fins lucrativos que com o Estado estabelecem relações de parceria, como as OS e as OSCIP”, disse.

Raupp relatou que a SBPC, como entidade que representa 86 sociedades científicas, está preocupada com a insegurança jurídica que se estabeleceu no país a partir de decisões como a tomada pelo TCU. “A SBPC está aqui para demonstrar a preocupação do setor de ciência e tecnologia com esta situação de insegurança jurídica que impacta negativamente em seu desenvolvimento”.

Para o presidente da SBPC, o período atual da história se caracteriza pela economia do conhecimento – ou seja, já não é mais suficiente ao país dispor apenas de recursos naturais, mesmo que abundantes. Nesse sentido, Raupp enfatizou que “o novo paradigma do desenvolvimento econômico é aliar recursos naturais a conhecimento, tecnologia e inovação. E a capacidade de gerenciamento dessa aliança por meio dos atores de C&T é fundamental para o desenvolvimento social e econômico do Brasil”.

Ele observou também que as instituições de ciência e tecnologia têm a responsabilidade de gerar novos conhecimentos e de transmiti-los à sociedade, e que as fundações de apoio são importantes em todo esse processo, inclusive na contratação de pessoal especializado pelo regime da CLT – o que não é permitido às universidades e institutos de pesquisa públicos.

Raupp lembrou que quando de sua criação, o CNPq não era regido pelo Regime Único dos servidores públicos, o que lhe permitia contratar celetistas. “Hoje, muitos processos são emperrados por esses sistemas que homogeinizam todas as relações, não importando suas especificidades”, reclamou.

Raupp defendeu que o terceiro setor, na forma de fundações, OS e Oscips, deve ser um dos instrumentos de articulação e de facilitação nas relações entre a Administração Pública e o setor privado. “A SBPC entende que o papel do terceiro setor é fundamental numa perspectiva que dê agilidade às relações com a Administração Pública – engessar as instituições é negativo para o sistema de C&T como um todo”.

Ele lembrou que as leis para regulamentar essas relações já existem e que, “obviamente devem ser respeitadas e aperfeiçoadas, quando necessário”. “Controle e fiscalização das fundações obrigatoriamente devem existir, mas sem descaracterizar a personalidade privada delas, garantida pela lei. Diminuir a capacidade de gestão dessas entidades é matar o futuro da sociedade brasileira”, finalizou.

Estado gerencial – O promotor de Justiça Airton Grazzioli, do Ministério Público de São Paulo, também participou da audiência pública na Câmara dos Deputados. De acordo com ele, o modelo das fundações de apoio é moderno e se insere no contexto do “Estado gerencial” que, ao contrário do “Estado burocrático”, está preocupado em implementar processos que possam trazer maior bem estar à população, de forma que as relações estabelecidas entre o público e o privado sejam salutares.

“Num estado gerencial, alianças intersetoriais se estabelecem e devem conviver na forma de parceria”, disse Grazzioli, que caracterizou o terceiro setor como um terceiro Estado de direito, o Direito Social, em complemento ao Direito Privado e ao Direito Público.

Grazzioli destacou a liberdade de atuação característica das entidades privadas: “as fundações estão no mundo privado, por isso não espera-se delas o mesmo comportamento do Poder Público, no qual se encontram as próprias universidades”.

O promotor paulista colocou em relevo também a necessidade de se implantar no país, especialmente por parte dos órgãos de fiscalização, a lógica do controle por resultado. “Antes do Estado gerencial havia o Estado burocrático, caracterizado pela Administração Pública desconfiada, que privilegiava procedimentos e não se importava com os resultados”, disse Grazzioli.

A Administração Pública gerencial, acentuou ele, privilegia resultados nos processos de fiscalização. “Em uma ordem de valores há um patamar de controle diferente e órgãos como Ministério Público, Tribunais de contas, Receita Federal etc deveriam seguir essa lógica”.

Autonomia – O MEC foi representado na audiência pelo diretor de Hospitais Universitários Federais e Residências de Saúde da Secretaria de Educação Superior (Sesu), José Rubens Rebeleto.

Ele informou que de 13.000 a 15.000 vagas precisarão ser criadas para que os hospitais continuem funcionando caso os funcionários das fundações de apoio sejam demitidos em razão do acórdão do TCU.

Rebeleto informou que o MEC vem trabalhando no sentido de criar condições legais que permitam aos reitores trabalhar sem a necessidade de recorrer às fundações. Uma das linhas de atuação do Ministério é fortalecer a autonomia das universidades.

Por parte das universidades e fundações de apoio, participaram da audiência o vice-diretor da Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia da UFRJ (Coppe/UFRJ), Aquilino Senra Martinez; o reitor da UFMG, Ronaldo Tadêu Pena; e o diretor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia (Ifet/Brasília), Garabed Kenchian.

Todos relataram as experiências positivas das fundações de apoio, especialmente na área de pesquisa e extensão, e destacaram os aspectos prejudiciais do acórdão do TCU no sentindo de impedi-las de cumprir seu papel de contribuir para o avanço da ciência, da tecnologia e da inovação no Brasil.
(Assessoria de Comunicação da SBPC)

Site: Jornal da Ciência
Data: 27/03/2009
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Seção:Notícias
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