Inovação é chave para a TI sair do lugar-comum
11/08/2009
Os CIOs da Serasa Experian, Grupo Vicunha e Banco do Brasil detalham quais os caminhos para estimular projetos inovadores e como isso têm afetado os negóciosA palavra inovação foi introduzida no contexto empresarial em 1939 pelo austríaco Joseph Schumpeter, criador da Teoria do Desenvolvimento Econômico. Ele defendia que as rupturas nos paradigmas tradicionais em relação a produtos, processos ou mercados ajudam a desencadear os ciclos de crescimento da economia.Passados 70 anos da publicação da teoria de Schumpeter, o termo inovação deixou de ser tratado apenas na esfera da macroeconomia para transformar-se em uma das bases atuais da administração empresarial. Como reflexo direto, a inovação entrou para a lista de atribuições dos principais executivos da organização, em especial, dos líderes de TI. O que aumenta a responsabilidade dos profissionais e divide opiniões, na medida em que questiona-se se o CIO deve arcar, sozinho, com essa missão.Os dilemas em torno da inovação, contudo, antecedem os debates sobre quem deve responder pelo tema. O primeiro e mais grave problema em relação ao assunto está na confusão que os profissionais ainda fazem quanto ao tênue limite que separa o projeto inovador de uma simples invenção ou ainda de uma melhoria de processos.“Para ser caracterizado como inovação, um projeto deve trazer receitas inéditas para a organização, sejam elas provenientes do aumento das vendas, ganho de participação no mercado ou valorização da marca”, define o professor de estratégia da Fundação Dom Cabral (FDC) – entidade que atua no desenvolvimento de executivos –, Luis Augusto Lobão.A origem das ideias serve como um bom referencial para analisar se elas contemplam algo realmente inovador, de acordo com Moyses Simantob, co-fundador do Fórum de Inovação, criado a partir de uma associação entre a Fundação Getúlio Vargas (FGV) e empresas privadas. “De forma geral, os projetos que nascem de análises dos concorrentes ou de reuniões voltadas a criar novidades (brainstorms) tendem a ser simples invenções”, detalha SimantobO melhor caminho para estimular iniciativas inovadoras, cita o especialista, é criar um ambiente propício a esse tipo de atividade, o que depende de processos, ferramentas e lideranças. Além disso, o sucesso desse tipo de iniciativa demanda tempo e, portanto, não pode ser tratado como um projeto pontual.A empresa de serviços financeiros Serasa Experian tem experimentado, desde 2004, um processo estruturado de estímulo a ideias inovadoras. A iniciativa nasceu a partir de uma mudança no modelo da área de TI da companhia, comandada pelo CIO da operação no País, Dorival Dourado. “Como o negócio da Serasa é essencialmente tecnologia, decidi administrar meu departamento como uma empresa independente, que gera receitas e despesas”, afirma Dourado.Junto com a avaliação independente dos resultados, a nova estrutura de TI da Serasa – que foi incorporada há cerca de dois anos pelo grupo Experian – previu um modelo diferenciado de comunicação entre a área de tecnologia e os demais departamentos da companhia. Para tanto, o CIO montou uma estrutura voltada à troca de informações entre os diversos públicos e que hoje representa a base da política global de inovação da empresa.Pelo novo modelo de comunicação da TI, o próprio Dourado dedica algumas horas de sua agenda de compromissos semanais para fazer visitas aos diversos departamentos da Serasa Experian. Durante os encontros informais, ele conversa com os profissionais da empresa e procura identificar sugestões de mudanças em produtos, processos ou modelos de negócio.Após uma primeira triagem, as melhores sugestões são apresentadas para fóruns de discussão que a empresa montou na internet e que reúnem funcionários, fornecedores, colaboradores em geral e pessoas do ambiente acadêmico.Além do aval das comunidades online, o projeto precisa atender outro requisito básico: trazer resultados efetivos para os acionistas da companhia. “E se julgarmos a ideia pertinente e viável, incumbimos a pessoa que a sugeriu a liderar sua implementação”, explica o CIO, ao afirmar que, com isso, a área de TI fica com a responsabilidade de fornecer todas as ferramentas e tecnologias necessárias.“Não temos um nome oficial para a iniciativa de inovação, nem tampouco uma estrutura formal. Simplesmente espalhamos a existência da ação pelos corredores”, detalha Dourado. Ele contabiliza que, atualmente, cerca de 65% das receitas totais geradas pela área de TI da Serasa Experian são provenientes de projetos inovadores sugeridos pelos colaboradores.Quanto ao incentivo para os profissionais colaborarem com as inovações da área de TI, o executivo argumenta que a empresa não oferece uma bonificação pelas ideias implementadas. “Mas damos o que as pessoas mais almejam: o reconhecimento”, diz o executivo que, graças a esse trabalho foi convidado a ocupar, a partir de setembro deste ano, a posição de vice-presidente executivo de desenvolvimento de produtos da Experian nos Estados UnidosEntre os exemplos de projetos criados a partir de sugestões dos funcionários da Serasa, Dourado cita o caso de um software que gera políticas de assinatura baseadas no modelo definido pela ICP-Brasil (Infraestrutura de Chaves Públicas), lançado em junho de 2008, para atender instituições financeiras e empresas de capital aberto. “Graças ao software, as empresas podem não apenas assinar seus documentos digitalmente, mas também definir tipos de compromisso e regras de arquivamento da assinatura”, diz o executivo, ao explicar as funcionalidades da solução.Ainda segundo ele, outra peculiaridade do sistema – inédito no mercado – está no fato dele validar contratos internacionais de forma virtual. Para tanto, possui mecanismos voltados a garantir autoria, revisão e concordância dos documentos, assim como de todas as testemunhas.Responsabilidade compartilhadaSe no caso da Serasa Experian o estímulo à inovação nasceu de uma iniciativa específica da área de TI, o que se vê hoje no mercado é um movimento inverso. As áreas de negócio das organizações têm pressionado o CIO a liderar esse tipo de ação, pelo fato de entenderem que qualquer ruptura nos modelos de negócio ou nos processos depende diretamente de tecnologia.O professor de gestão da inovação da Business School São Paulo – instituição de ensino para executivos –, Fernando Consenza, questiona essa tendência ao lembrar que todas as áreas de uma empresa, não só a TI, precisam estar envolvidas nesse tipo de atividade.“A única diferença entre o CIO e os demais gestores da empresa é que o profissional de tecnologia tende a possuir os requisitos necessários para conduzir processos”, concorda o coordenador do curso de administração da inovação da FGV, Chu Shao Yong. Entre as competências que qualificam o líder de TI à função, Yong cita a capacidade de influenciar os principais gestores da organização, o foco em trazer resultados ao negócio, o conhecimento e relacionamento dentro da companhia, o perfil articulador e a agilidade para responder aos problemas.Para o coordenador da FGV, no entanto, a responsabilidade pelos projetos ligados à inovação só pode recair sobre os CIOs que estiverem dispostos a assumir essa função. Caso contrário, as ações dificilmente terão o sucesso esperado.A gerente da área de TI do Grupo Vicunha – uma das maiores indústrias têxteis da América Latina –, Janet Donio ilustra bem a opinião de Yong. A executiva decidiu, por vontade própria, encabeçar um projeto voltado a estimular inovações na companhia. E a ideia, conta Janet, nasceu após a organização anunciar uma série de cortes de custos, com o objetivo de reverter um prejuízo líquido de aproximadamente 197 milhões de reais, em 2008, por conta de operações com derivativos de câmbio.Em vez de tentar solucionar apenas o problema da sua área, a qual foi severamente afetada pelos cortes, Janet assumiu o desafio de coordenar uma iniciativa para promover mudanças contínuas nos modelos de negócio de toda a Vicunha. Uma das principais ações adotadas pela executiva foi a criação de grupos multidisciplinares, formados por 12 pessoas de diferentes departamentos da organização, que se reúnem mensalmente para debater saídas para reduzir custos e melhorar a produtividade da companhia.“A ideia é unir os profissionais em conversas descontraídas, que melhorem a troca de informações entre os departamentos e levantem questões que podem ser aprimoradas por meio da inovação”, conta Janet, que complementa: “Além de indicar quais quesitos precisam ser mudados, as reuniões servem para motivar as equipes. Pois, mesmo atordoadas pelos efeitos da crise, as pessoas se sentem ouvidas e veem suas sugestões de melhoria implementadas.”Um dos primeiros resultados da iniciativa de estímulo à inovação veio com o projeto – proposto por um funcionário da companhia – de adquirir ativos por meio de aluguel e leasing. A iniciativa, implementada desde o início deste ano fiscal da companhia, permitiu melhorar rapidamente o fluxo de caixa da organização.A gerente de TI da Vicunha conta que, no caso específico da área de TI, graças à nova estratégia foi possível modernizar a infraestrutura, sem grandes investimentos iniciais. “Como vivemos um momento de restrição orçamentária é importante contar com essa opção para ganhar fôlego”, comenta a executiva.Quanto aos resultados, a gerente não divulga os valores totais obtidos com a transação de venda dos ativos. Mas ela afirma que a iniciativa trouxe ganhos indiretos, como a redução de gastos tributários e contábeis.A executiva também destaca que as atividades de estímulo à inovação têm servido para divulgar mais o trabalho da área de TI para o restante da organização. “Na história da Vicunha, a tecnologia da informação nunca teve tanta importância estratégica”, relata Janet.O professor da Business School São Paulo, Fernando Cosenza, alerta que o sucesso ou o fracasso de qualquer atividade relacionada à inovação não está no papel que a TI exerce, mas na própria cultura dos líderes da companhia. Para tanto, ele defende a necessidade de criar um ambiente estimulante à sugestão de ideias por parte dos colaboradores de qualquer área ou nível hierárquico.No caso do Banco do Brasil, que hoje representa a segunda maior instituição financeira do País, a saída para envolver toda a empresa com a inovação veio com a criação de uma área dedicada especificamente ao tema. E o vice-presidente de TI do grupo, José Luis Salinas, conta que seu departamento funciona apenas como um suporte. “Pelo fato de 100% das operações bancárias serem baseadas em tecnologia, eu participo como um catalisador, ou seja, avalio a forma de colocar as ideias em prática”, informa Salinas.E, apesar de não estar diretamente ligado à inovação, ele relata que a área contribuiu para que o banco aprovasse um orçamento de 1,3 bilhão de reais para a TI em 2009. “A organização manteve o budget do ano passado para que não adiássemos os projetos inovadores”, diz o vice-presidente.Entre as iniciativas que estão no forno, ele anuncia a implementação de terminais de autoatendimento que reconhecem cédulas de dinheiro e folhas de cheque, dispensando assim a necessidade de envelopes e conferências manuais.O projeto, conduzido pela área de inovação do Banco do Brasil, nasceu há cerca de dois anos, a partir de sugestões da equipe de TI e deve ser lançado no mercado no segundo semestre de 2010. Os principais objetivos da iniciativa são agilizar o processo de compensação dos depósitos nos terminais de auto-atendimento e reduzir custos.A partir de recursos de reconhecimento e digitalização, os terminais vão estar habilitados a identificar as cédulas depositadas e podem reutilizá-las, automaticamente, para as transações de saque. “O que diminui a necessidade de reposição de dinheiro nos caixas”, explica Salinas, ao afirmar que isso vai economizar custos com transporte e distribuição.No caso dos depósitos em cheque, o projeto prevê que o mesmo mecanismo de reconhecimento e digitalização das cédulas faça a conferência de assinatura do depositante, de forma virtual. O que vai diminuir o tempo para que o valor seja creditado em conta. Quanto ao segredo para desenvolver esse tipo de iniciativa inovadora, o vice-presidente afirma que isso só foi possível graças ao esforço conjunto de diferentes departamentos da instituição financeira.Iniciativas como da Serasa Experian,Vicunha e do Banco do Brasil estão deixando de ser raridade. Exemplos de ações inovadoras com bons resultados começam a pipocar em muitas companhias brasileiras. Prova de que os CIOs assumiram o desafio. O que não se pode esquecer, contudo, é que a inovação deve ser um objetivo e responsabilidade de todos dentro da empresa.Site: CIOData: 10/08/2009Hora: 08h05Seção: GestãoAutor: Patrícia LisboaLink: http://cio.uol.com.br/gestao/2009/08/07/inovacao-e-chave-para-a-ti-sair-do-lugar-comum/